Decisões e seus tipos

A tomada de decisão é uma ação exercida por qualquer pessoa e em todas as áreas da vida. Todos os dias precisamos definir a roupa que usaremos, o caminho que tomaremos até o trabalho, se atenderemos um telefonema, se responderemos uma mensagem comum de email.

Estes são exemplos de decisões comuns ao nosso dia-a-dia e, portanto, lidar com elas não é uma tarefa difícil. Isso ocorre porque elas apresentam uma estrutura já conhecida por nós decisores. Além disso nós já desenvolvemos a experiência necessária para executá-la e os recursos necessários estão em nosso domínio.

Existem também aquelas decisões que acarretam uma sobrecarga cognitiva ao decisor e são chamadas de decisões complexas. Elas se comportam de forma inesperada, lidam com múltiplas variáveis e risco, podem exigir a execução de muitas ações comuns ao decisor, são inter-relacionadas e não apresentam uma estrutura e objetivos bem definidos.

Assim como as decisões tradicionais, as complexas podem também ser observadas em nosso dia-a-dia. A diferença entre elas está principalmente na estrutura da decisão e no tipo de recursos necessários para sua solução. Decisões complexas não podem ser consideradas como a dinâmica de um jogo de quebra-cabeças onde cada peça tem um encaixe pré-definido. Este é o exemplo clássico de uma decisão tradicional, com alternativas conhecidas e encaixes perfeitos.

Encaixe Perfeito
Encaixe Perfeito

Cenário de Decisão Complexa

Como em todas as manhãs você assiste aos noticiários de seu estado e consulta seu aplicativo de trânsito e navegação favorito em busca das melhores rotas até seu trabalho, entendendo que melhor neste caso é o menor tempo de deslocamento. Suponha que você tenha decidido por uma rota, considerando um conjunto de alternativas propostas. Para você prosseguir com a execução desta alternativa você precisa pegar seu carro e se direcionar até uma das vias principais de ligação das zonas norte e sul de sua cidade, para em seguida pegar a saída correspondente ao seu destino.

No entanto, antes de chegar a via principal de ligação da cidade você se depara com um grave acidente na avenida de acesso à via principal, causando a interdição da avenida e um grande engarrafamento. Este novo cenário é traduzido em um ambiente propício aos arrastões tão comuns dos grandes centros urbanos brasileiros. Nesse momento você, que exerce o papel de decisor, precisa considerar novas alternativas, ou seja, rotas, e múltiplas variáveis a fim de que sua vida seja preservada, seu patrimônio permaneça intacto, seu horário no trabalho seja de preferência respeitado, que as regras de trânsito não sejam quebradas, que você se posicione com uma solução diante de um fator inesperado na rota escolhida….

Observe que neste exemplo temos um encadeamento de decisões a serem tomadas, múltiplas variáveis a serem consideradas, e possíveis soluções ainda desconhecidas por você decisor. A fim de que esta solução complexa seja proposta e executada caberá a você decisor utilizar não apenas as informações já formalizadas como as orientações de trânsito, informações de aplicativos de navegação e noticiários; mas também de recursos inerentes essencialmente ao decisor como suas experiências similares (caso haja), criatividade para solução de problemas, intuição, desejos e crenças. Por exemplo, é através da criatividade do decisor que novos meios de transporte são incorporados à análise das novas alternativas (rotas).

Considerando os elementos cognitivos necessários para a tomada de decisões complexas é possível comparar o decisor a um artista. Assim como o artista incorpora em sua arte sua própria criatividade, experiências, crenças, intuição e desejos, o decisor ao lidar com decisões de alta complexidade precisa usar desses mesmos elementos para desenvolver soluções com altos impactos positivos e baixos impactos negativos.

Gestão da Decisão

Da mesma forma que ocorre no campo pessoal, acontece também nas organizações. Ali os profissionais (decisores) precisam tomar decisões, sejam elas tradicionais/estruturadas ou complexas. A gestão do conhecimento manipulado pelas decisões tradicionais/estruturadas é atualmente suprida pelos modelos de conhecimento já difundidos como CommonKADS (SCHREIBER et al., 2002), Business Process Knowledge (BPK) (PAPAVASSILIOU et al., 2002) ou por modelos e linguagens de processos de negócio formalizadas como Business Process Management Notation (BPMN) (OMG, 2014), Event Process Chain (EPC) (KORHERR e LIST, 2007), haja vista que a tomada de decisão é uma ação (FRANÇA, 2012).

Atualmente o problema da gestão das decisões reside no campo das decisões complexas, seja pela sobrecarga cognitiva dos decisores, seja pela dificuldade em gerir o conhecimento inerente a este tipo de decisão. Decisores sobrecarregados cognitivamente tendem a cometer erros ou a direcionar a organização ao campo comum. Em ambos os casos, a organização enfrenta perdas significativas. A sobrecarga cognitiva do decisor impede o desenvolvimento e implementação de sua criatividade, inovação e intuição. Para a solução deste problema estratégias de suporte à orientação do decisor têm sido desenvolvidas (FRANÇA, 2017a, 2017b).

Como solução para o mapeamento do conhecimento inerente as decisões que manipulam um alto grau de conhecimento tácito (intuição, experiências, criatividade e etc.) e consequentemente das ações e recursos envolvidos, entra em cena o Processo Intensivo em Conhecimento (PIC).

Um PIC normalmente compreende uma sequência de atividades baseadas em uma aquisição, compartilhamento, armazenamento e reuso intensivo de conhecimento e, portanto, a quantidade de valor adicionado às organizações é dependente do conhecimento dos executores do processo (FRANÇA et al., 2014).

Esses processos são mais complexos, uma vez que lidam com definições difusas e tácitas, com decisões imprevistas, tarefas e caminhos orientados à criatividade e inovação, e execuções dinâmicas baseadas na experiência adquirida pelos executores. As decisões referenciadas nesse texto se referem aquelas discutidas, analisadas e tomadas em tempo de execução dos PIC’s (on the fly) e, portanto, envolvem um tipo das atividades previstas neste tipo de processo.

Discussões como a representação de PIC’s têm sido desenvolvidas (NETTO, SANTORO e BAIÃO, 2014) a fim de que um processo desestruturado por essência e com alta carga de interações sociais não seja engessada, perdendo assim suas características nativas. Com base nestas discussões, observamos no PIC uma relação muito próxima entre os executores do processo e as ações executadas por eles, tema este já discutido neste blog que vale a visita: Social BPM: Processos de negócio, Colaboração e Tecnologia Social.

Conclusão

Como reflexão final, vale destacar que durante a execução de PIC’s as ações colaborativas entre os envolvidos no processo exercem papel de suporte ao executor e à organização, em virtude das características e necessidades de PIC’s como baixa estrutura, criatividade e inovação. Aqui neste mesmo blog já discutimos a influência de estratégias colaborativas no desenvolvimento da inovação.

Observe que você, executor de um processo intensivo em conhecimento, é um artista que desenvolve e põe em prática sua criatividade na execução do processo e, consequentemente, nas decisões que surgem em seu caminho.

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Referências

FRANÇA, J. B. S.; NEIVA, F. W. ; DIAS, A. F. S. ; BORGES, M. R. S. Towards Projected Impacts on Emergency Domains Through a Conceptual Framework. In: International Conference on Information Systems for Crisis Response and Management, 2017a, Albi, France.

FRANÇA, J. B. S.; NEIVA, F. W. ; DIAS, A. F. S. ; BORGES, M. R. S. Toward Impact Projection Characterization of Complex Decisions. In: IEEE International Conference on Systems, Man, and Cybernetics, 2017b, Banff, v. 1. pp. 1-6.

FRANÇA, J. B. S. Uma Ontologia para Definição de Processos Intensivos em Conhecimento. Dissertação de Mestrado, Departamento de Informática Aplicada (DIA), Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2012.

KORHERR, B.; LIST, B.: Extending the epc and the bpmn with business goals and performance measures. 9th International Conference on Enterprise Information Systems – ICEIS, Funchal – Madeira, Portugal, 2007.

NETTO, J. M.; SANTORO, F. M.; BAIAO, F. A. Evaluating KIPN for modeling KIP. Lecture Notes in Business Information Processing, v. 171, pp. 549-561, 2014.

OMG: Business Process Modeling and Notation (BPMN), Version 2.0, 2014. Disponível em: https://www.bpmn.org/.

PAPAVASSILIOU, G.; NTIOUDIS, S.; ABECKER, A.; MENTZAS, G. Managing Knowledge in Weakly Structured Administrative Process. The Third European Conference on Organization Knowledge. 2002.

FRANÇA, J. B. S.; NETTO, J. M.; DO E.  S. CARVALHO, JULIANA; SANTORO, F. M.; BAIÃO, F. A.; PIMENTEL, M. KIPO: the knowledge-intensive process ontology. Software and Systems Modeling, v. 1, pp. 1, 2014.

SCHREIBER, G. AKKERMANS, H.; ANJEWIERDEN, A.; HOOG, R.; SHADBOLT, N.; DE VELDE, W. V.; AND WIELINGA, B.: Knowledge Engineering and Management: The CommonKADS Methodology. MIT Press: Cambridge. 2002.